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A ornamentação cerâmica

na arquitectura do Romantismo em Portugal

 mostruário de azulejos da Fábrica das Devesas na Pampilhosa

 

 

 

por Ana Margarida Portela Domingues (como bolseira da FCT)

 

Tese de Doutoramento em História da Arte

Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2009

2 volumes policopiados (614+358 páginas, incluindo 1111 ilustrações)

 

 

RESUMO

Neste trabalho, são analisadas diversas vertentes da ornamentação cerâmica na arquitectura do Romantismo em Portugal, desde os exemplos pré-românticos, até cerca de 1880. Para além da história das fábricas de cerâmica do Porto / Vila Nova de Gaia e de Lisboa que produziram tais artefactos, é analisado o seu estilo, nos pontos que mais afastaram ou aproximaram os principais pólos de produção. São frequentes os contrapontos com o Brasil, de modo a desmontar algumas mistificações relacionadas com o surgimento da azulejaria de fachada e com as chamadas "casas de brasileiros". Ao nível dos azulejos, da estatuária, dos vasos, dos globos, das pinhas e de outros ornatos para platibandas e balaustradas, são feitas várias comparações, diacrónicas e sincrónicas, em termos estéticos e técnicos. É analisada também a disposição das peças nas fachadas e as tipologias arquitectónicas em que mais surgem (incluindo a arquitectura religiosa), assim como a prevalência em determinadas regiões e a associação a fenómenos sociais. Ao nível dos artistas, são especialmente abordados José Joaquim Teixeira Lopes e António Soares dos Reis.

 

 

Ceramic decoration on Portuguese architecture of the 19th century

PhD thesis in art history

 

summary

Ceramic decoration in façades is one of the most distinctive features of Portuguese architecture of the 19th century. From the well-known glazed tiles to the statues, vases, urns, globes and other faïence or terracotta artefacts on the platibandas and balustrades, this scholar work presents ceramic decoration from almost all possible approaches, particularly artistic, historical (c. 1834-1880), technical and sociological. Diachronic and synchronic comparisons range from the factories' style to the prevalence of specific architectonic solutions in several regions of Portugal. The alleged Brazilian influence into this Portuguese trend is discussed and demystified.

 

 

 

mostruário de azulejos de padrão e cercaduras da Fábrica das Devesas na Pampilhosa

 

 

 

 

Sumário

Agradecimentos.XI

Preâmbulo.XIV

 

1. ANTECEDENTES

1.1 O azulejo entre as outras formas de ornamentação cerâmica na arquitectura.1

1.2 Da azulejaria de interior aos painéis de azulejos em fachadas.4

 

2. A azulejaria no contexto da consolidação de um gosto Romântico em Portugal

2.1 Critérios adoptados para o balizamento temporal do Romantismo.19

2.2 As teses de Santos Simões relativamente ao surgimento da azulejaria de fachada em Portugal.21

2.2.1 O caso brasileiro e a tese dos factores climáticos.22

2.2.2 O factor económico.31

2.2.3 A alegada precocidade brasileira na generalização da azulejaria de fachada.34

2.2.4 A alegada influência brasileira na generalização da azulejaria de fachada em Portugal.37

2.3 A questão das primeiras fachadas azulejadas em Portugal.41

2.3.1 Fachadas oitocentistas com azulejo setecentista.41

2.3.2 Duas fachadas com azulejo oitocentista inspirado em modelo pombalino, em Ovar e no Porto.44

2.3.3 Tipos de fachadas que terão recebido azulejamento mais precoce.49

2.3.3.1 Factores determinantes para uma baixa prevalência da azulejaria de fachada em Sintra.50

2.3.4 A azulejaria de fachada como fenómeno burguês.55

2.3.5 A azulejaria de fachada como solução decorativa e intimista.58

2.3.5.1 A azulejaria no Palácio do Farrobo.61

2.3.5.2 Novas fachadas intimistas e decorativas sem recurso à azulejaria.63

2.3.5.3 A azulejaria de fachada entre o pragmatismo urbano e o decorativismo.69

2.3.6 O papel dos "brasileiros" no surgimento do gosto pela azulejaria de fachada em Portugal.74

2.3.7 O problema da datação das primeiras fachadas azulejadas.77

2.4 Os primeiros padrões de azulejaria de fachada em Portugal.81

2.4.1 Alguns dos mais antigos padrões de azulejo de fachada fabricados no Porto e Vila Nova de Gaia.81

2.4.1.1 Dois dos mais arcaizantes padrões de azulejo de fachada fabricados no Porto e Vila Nova de Gaia.83

2.4.2 Pontos de contacto entre as primeiras fachadas azulejadas de Lisboa e do Porto.85

2.4.3 Padrões baseados em motivos florais pintados em azul sobre fundo branco.87

2.4.3.1 A progressiva introdução da estampilhagem nas fábricas do Porto e Vila Nova de Gaia.89

2.4.4 Influências e transmutação estética entre pólos de produção e entre fábricas do mesmo pólo.92

2.4.5 A predominância dos tons azuis e os pontos de afastamento entre as primeiras fachadas azulejadas de Lisboa e Porto.100

2.4.6 Exemplos de primeiros padrões azulados em Lisboa e contextos de aplicação.102

2.5 Extravasamento do fenómeno da azulejaria de fachada para outros núcleos urbanos.109

2.5.1 Primeiros exemplos de azulejaria de fachada em núcleos urbanos dos arredores de Lisboa e outros padrões existentes na Capital.118

2.6 Primeiros exemplos de policromia na azulejaria de fachada do Porto / Vila Nova de Gaia.122

 

3. Primeiros exemplos de estatuária, vasos e outros ornamentos cerâmicos na arquitectura do Romantismo em Portugal

3.1 Antecedentes.125

3.1.1 O carácter urbano da estatuária de fachada e a estatuária em monumentos públicos barrocos.128

3.1.2 Estátuas em jardins: da pedra à cerâmica.130

3.2 Alguns exemplos portugueses anteriores ao Romantismo de estatuária cerâmica em jardins.132

3.2.1 Estátuas na Quinta dos Azulejos atribuídas à Real Fábrica do Rato.132

3.2.2 Níveis de aceitação da estatuária em faiança esmaltada na decoração de jardins.137

3.2.3 Influência da Real Fábrica do Rato na ornamentação cerâmica aplicada à arquitectura do Romantismo em Portugal.138

3.3 Estátuas no coroamento de fachadas: da pedra à cerâmica.140

3.4 As primeiras estátuas em cerâmica e os primeiros vasos no coroamento de fachadas.145

3.4.1 Exemplos de transição.146

3.4.1.1 O museu de João Allen e outra casa em Vila Nova de Gaia.148

3.4.1.2 Dificuldades na datação destas peças.150

3.4.1.3 Os vasos do jardim da Quinta dos Azulejos.151

3.4.2 A Fábrica do Colégio e algumas das primeiras fábricas do Porto / Vila Nova de Gaia que produziram estatuária alegórica e vasos para jardins.154

3.4.3 A generalização das platibandas e balaustradas.157

3.4.3.1 A casa Teixeira Maciel, em Viana do Castelo e o recurso a peças de proveniência estrangeira.160

 

4. As fábricas e o seu estilo (1834-1880)

4.1 Fábricas do Porto e de Vila Nova de Gaia que produziram ornamentação cerâmica para fachadas e jardins, nos primeiros anos do Romantismo.163

4.1.1 A Fábrica de Santo António do Vale da Piedade.168

4.1.2 A Fábrica de Louça de Miragaia.180

4.1.2.1 A produção da Fábrica de Louça de Miragaia e as semelhanças com a produção de Santo António do Vale da Piedade.188

4.1.2.2 Um padrão de azulejo produzido pela Fábrica de Miragaia e com ampla difusão.198

4.1.2.2 A policromia nos azulejos de Santo António do Vale da Piedade.209

4.1.2.3 Variantes de um padrão semelhante ao floral tipo Miragaia.215

4.1.3 A Fábrica de Louça de Massarelos.219

4.1.3.1 A produção da Fábrica de Louça de Massarelos.222

4.1.3.2 Outro tipo de produção da Fábrica de Massarelos.235

4.1.4 As fábricas geridas pela família Nunes da Cunha.245

4.1.4.1 A Fábrica da Fervença.245

4.1.4.2 A Fábrica do Carvalhinho.246

4.1.4.2.1 As estátuas e pinhas da Fábrica do Carvalhinho e as primeiras pinhas produzidas no Porto / Vila Nova de Gaia.250

4.1.4.2.2 Os primeiros azulejos da Fábrica do Carvalhinho.255

4.1.4.3 A Fábrica do Monte Cavaco do Padre Gualter da Piedade Queiroz.267

4.1.4.3.1 A produção da Fábrica do Monte Cavaco.273

4.1.5 As fábricas de cerâmica do Porto / Vila Nova de Gaia na década de 1860

4.2 Fábricas de Lisboa que produziram ornamentação cerâmica para fachadas e jardins, nos primeiros anos do Romantismo.285

4.2.1 A Fábrica Roseira.286

4.2.1.1 Algumas notas sobre a produção da Fábrica Roseira.294

4.2.2 A Fábrica da Calçada do Monte.296

4.2.3 A Fábrica Constância.304

4.2.4 A Fábrica da Rua da Imprensa Nacional.307

4.2.5 A Fábrica Viúva Lamego.310

4.2.5.1 A fachada do depósito da Fábrica Viúva Lamego e obras de azulejamento similares.314

4.2.5.1.1 As encomendas de Manuel Moreira Garcia.324

4.2.6 Contraponto entre a produção de azulejo de padrão da Fábrica Viúva Lamego e de outras fábricas.333

4.2.6.1 As frentes de loja.333

4.2.6.2 Os padrões de diagonais pintados a azul.338

4.2.6.3 Coincidências de estilo entre a Fábrica Roseira e a Fábrica Viúva Lamego.348

4.2.6.4 O Palácio Beau Séjour.362

 

5. Soluções de ornamentação cerâmica na arquitectura portuguesa do Romantismo

5.1 A ornamentação cerâmica na arquitectura de "brasileiros" de torna-viagem.369

5.1.1 A Casa do Campo Pequeno, de Joaquim Pinto Leite.370

5.1.2 Sucedâneos do azulejo no revestimento de fachadas.375

5.1.3 A ornamentação cerâmica da casa de "brasileiro", segundo a novelística romântica.382

5.2 A Casa do Chão Verde.389

5.2.1 A produção da Fábrica da Calçada do Monte para a Casa do Chão Verde.395

5.2.2 A produção da Fábrica de Santo António do Vale da Piedade para a Casa do Chão Verde.400

5.2.2.1 Padrões com listas a formar losangos e outros padrões geométricos ilusionistas.407

5.2.2.2 Os vasos da Fábrica de Santo António do Vale da Piedade e as semelhanças com a produção de outras fábricas.415

5.2.3 A produção da Fábrica de Cerâmica das Devesas para a Casa do Chão Verde.424

5.3 Os novos modelos de estatuária da Fábrica de Santo António do Vale da Piedade em confronto com os da Fábrica de Cerâmica das Devesas.433

5.3.1 Do período de João do Rio Júnior à decadência da Fábrica de Santo António do Vale da Piedade.437

5.3.2 As figuras modeladas por José Joaquim Teixeira Lopes para a Fábrica de Santo António do Vale da Piedade.448

5.3.3 As figuras modeladas por António Soares dos Reis para a Fábrica de Santo António do Vale da Piedade.455

5.4 A estatuária da Fábrica Viúva Lamego e outras figuras alegóricas produzidas em Lisboa.464

5.5 Contraponto entre Portugal e Brasil nas soluções de ornamentação cerâmica aplicadas à arquitectura do Romantismo.473

5.5.1 O caso de São Luís do Maranhão.474

5.5.2 Um caso paradigmático em Ouro Preto.477

5.5.3 O desfasamento cronológico entre Portugal e Brasil, ao nível da azulejaria de fachada.482

5.5.4 O caso de Belém do Pará.485

5.5.5 Outros exemplos no Brasil.487

5.5.6 Outros elementos de ornamentação cerâmica na arquitectura brasileira de finais do século XIX.495

5.5.7 Os calões decorados e outros artefactos similares.503

5.5.8 A questão da preponderância dos artefactos da Fábrica de Santo António do Vale da Piedade no Brasil.510

5.6 A ornamentação cerâmica na arquitectura religiosa do Romantismo.513

5.6.1 Os primeiros casos de azulejaria de fachada com motivos religiosos.516

5.6.2 O azulejamento de relógios em torres.522

5.6.3 Exemplos paradigmáticos de azulejaria de fachada em edifícios religiosos.523

5.6.4 Notas sobre a aplicação de azulejaria oitocentista no interior de edifícios religiosos.528

5.6.5 Exemplos mais tardios de azulejaria de fachada em edifícios religiosos.534

5.6.6 Outro tipo de ornamentação cerâmica oitocentista em fachadas de edifícios religioso.537

 

Conclusão.539

Fontes e bibliografia.545

 

 

evolução de um padrão para azulejaria de fachada

 

 

Justificação inicial para a escolha do tema desta tese

Dentro do Património Arquitectónico Nacional, uma das vertentes menos estudada é a da arquitectura oitocentista correspondente ao período do Romantismo (entre cerca de 1834 e 1910). Frequentemente conotada de forma redutora com os ecletismos, esta arquitectura tem sido pouco abordada na produção científica nacional sobretudo devido a um certo preconceito de que a mesma enferma, havendo excessiva tendência a classificá-la como mero revivalismo ou pastiche. Na verdade, só algumas grandes obras e alguns tipos específicos de arquitectura romântica, em locais bem delimitados de Portugal, têm sido objecto de estudo aturado, pelo que estamos ainda longe de um corpus científico suficientemente vasto para se poder determinar facilmente qual o valor arquitectónico de muitos edifícios sobre os quais hoje pende a ameaça da remodelação ou da pura demolição.

Felizmente, o crescente distanciamento temporal e geracional tem vindo a atenuar a falsa crença de que a arquitectura do Romantismo foi uma fase menos conseguida da nossa arquitectura. Não só essa crença é totalmente incorrecta, como negligenciar o estudo da arquitectura portuguesa do Romantismo constituiria uma omissão em termos da necessidade de compreender melhor a História social portuguesa num período tão rico.

Nos últimos anos, têm surgido alguns trabalhos académicos de relevo sobre a arquitectura do Romantismo em Portugal. Podemos citar os nomes de Regina Anacleto, Raquel Henriques da Silva, Lúcia Rosas, Maria João Baptista Neto, entre outros. Contudo, está ainda muitíssimo por fazer, sobretudo no que diz respeito ao estudo, não das grandes obras de autor, mas sobretudo da arquitectura tal e qual ela se apresenta nas nossas cidades, quer nas suas vertentes mais eruditas, quer nas mais vernaculares.

O nosso programa de trabalhos com vista à elaboração de uma tese de Doutoramento pretendia preencher essa lacuna, não de forma completa – o que seria inviável numa só dissertação – mas centrando-se numa vertente específica que se encontra debilmente estudada em Portugal, embora seja regularmente aflorada em estudos sobre arquitectura portuguesa do Romantismo: os artefactos cerâmicos com aplicação à arquitectura.

Sobre os artefactos cerâmicos com aplicação à arquitectura, praticamente apenas o azulejo de fachada foi já objecto de alguma sistematização, embora em trabalhos muito parcelares e pouco comparativos. A estatuária, as balaustradas e outro tipo de remates, bem como as cantarias fingidas – recurso comum em vários dos principais edifícios do Romantismo em Portugal – encontram-se praticamente por estudar. A nossa dissertação de Mestrado terá sido talvez o primeiro trabalho académico que abordou o assunto com certo realce, pelo que pretendíamos fazer um aprofundamento.

Os artefactos cerâmicos com aplicação à arquitectura foram fundamentais para fazer a diferença entre a arquitectura do Romantismo e a de épocas anteriores. Antes do Romantismo, a azulejaria raramente se usava em exteriores e quase nunca se usava em fachadas urbanas, sobretudo como forma total de revestimento. Este gosto pelo azulejo de fachada – de tal modo tipicamente português e marcante que veio até aos nossos dias, necessita de explicações mais convincentes do que a mera influência brasileira, apontada de forma ligeira na bibliografia existente.

Antes do Romantismo, a estatuária de remate para edifícios era rara e praticamente ausente da arquitectura vernacular. Outro tipo de remates, como arabescos e platibandas ou balaustradas, não eram muito usados e quando o eram, não se produziam em cerâmica, mas em pedra.

Inicialmente, o projecto de investigação intitulava-se "As artes industriais na arquitectura portuguesa da época do Romantismo – a produção de cantarias de ornato e de artefactos cerâmicos pelo complexo fabril das Devesas". Contudo, em 2007, atendendo ao grande volume de informação em tratamento, foi aprovada pela FCT a alteração do tema para "A ornamentação cerâmica na arquitectura do Romantismo em Portugal".

Sobre as cantarias de ornato no Romantismo em Portugal, praticamente apenas dois autores publicaram trabalhos de investigação relevantes: Francisco Queiroz e Lucília Verdelho da Costa. Com o trabalho que nos propúnhamos desenvolver, pretendíamos ampliar o conhecimento que se tem desta área complementar da arquitectura. Antes do Romantismo, as cantarias de ornato já existiam, mas as estéticas eram diferentes e a forma de produzir também o era. No Romantismo, a progressiva mecanização e a utilização crescente de pedras mais nobres, como o mármore, acabaria por conferir aos edifícios um carácter singular. O novo fenómeno dos cemitérios públicos veio mesmo permitir um amplo mercado de cantarias de ornato, onde os mestres de obras e pedreiros quase não intervinham. Nunca como no século XIX se produziram em Portugal obras tão virtuosas em termos de ornato arquitectónico, estando alguns dos melhores exemplos localizados em cemitérios portugueses, aguardando o estudo devido enquanto não sucumbirem à voracidade do tempo.

Todos estes materiais e os ornatos que deles se serviram são uma matriz e uma marca indelével da arquitectura portuguesa do Romantismo, pelo que urge fazer o seu estudo. Contudo, não nos cingiríamos ao estudo de um só centro produtor: pretendíamos também abordar os restantes produtores portugueses de cantarias de ornato e de artefactos de cerâmica aplicados à arquitectura, tais como as grandes oficinas de António Moreira Rato & Filhos e Germano José de Sales ou a Fábrica Viúva Lamego, todas em Lisboa. No Porto, pretendíamos dar especial realce à Fábrica de Santo António do Vale da Piedade e às oficinas de cantarias com origem remota na de Emídio Amatucci.

Em síntese, a grande mudança de gosto que se deu no Romantismo esteve claramente relacionada com as próprias possibilidades oferecidas pelo desenvolvimento industrial e pelo fenómeno de produção em larga escala com base em moldes. A arte passou a andar lado a lado com a indústria. Foi talvez o período histórico em que mais se aproximaram as duas vertentes, que hoje se vêem geralmente como antagónicas, ao ponto de se poder falar em artes industriais no Romantismo. O nosso estudo é precisamente sobre as artes industriais nessa época e, mais em concreto, sobre os artefactos de cerâmica aplicados à arquitectura.

O maior e melhor produtor português desta gama de componentes arquitectónicos foi António Almeida da Costa, mentor da Fábrica de Cerâmica das Devesas, a qual viria a transformar-se num complexo fabril de grande dimensão dedicado a praticamente todas as artes industriais, sobretudo as directamente ligadas à arquitectura. Para além das cantarias de ornato e dos artefactos de cerâmica, este complexo fabril das Devesas (Gaia) produziu também artefactos de ferro fundido e esteve ligado à produção de estuques.

 

estátuas para decoração de jardins, fachadas e platibandas - figuras alegóricas de produção da Fábrica das Devesas

 

Objectivos iniciais

Este pretende ser um trabalho de História da Arte em Portugal, mas também com forte componente de História da Indústria e de Arqueologia Industrial, já que se dirige ao estudo dos artefactos, dos edifícios onde foram aplicados, das oficinas que os produziram, dos artistas que os conceberam, das condições de produção e dos vestígios materiais das mesmas. Trata-se, afinal, de um estudo sobre as origens do design em Portugal, com aplicação à decoração de fachadas e a outros espaços de valência pública. Como corolário da investigação que temos vindo a fazer desde há alguns anos, os objectivos do nosso programa de Doutoramento eram claros:

Demonstrar que arte e indústria não só não são incompatíveis, como se fundiram de forma perfeita no século XIX, dando origem a peças interessantíssimas;
Demonstrar como estas peças, mesmo tendo em conta várias influências, são tipicamente portuguesas e constituem uma mais valia no âmbito do Património Arquitectónico português;
Contribuir para um melhor conhecimento dos espaços de produção destes artefactos, de modo a que seja possível salvaguardar e valorizar o que deles resta, nomeadamente o complexo fabril das Devesas, que não só foi o melhor e maior do seu tempo, como é ainda o exemplo mais flagrante da própria utilização destes artefactos (sobretudo cerâmicos) na arquitectura;

 

Programa desenvolvido e sua Metodologia

O programa versou o estudo dos artefactos de cerâmica aplicados à arquitectura portuguesa, durante o Romantismo (cerca de 1834-1910).

 

Dentro das cantarias de ornato, o estudo foi dirigido sobretudo:

À produção para monumentos públicos, para monumentos sepulcrais e para outros espaços públicos (como fontes e jardins), bem como à produção para fachadas de edifícios. Este estudo teve como base um levantamento em todo o país, registo visual, atribuição de autoria, análise temática, iconográfica e iconológica, comparação e contextualização com exemplos internacionais.
Aos produtores, nomeadamente às maiores e melhores oficinas de cantarias de ornato portuguesas do período romântico, como por exemplo as de: Fidele Baldi, Augusto Alves Loureiro, João Anastácio da Gama, Joaquim Antunes dos Santos, Severiano João de Abreu, António Moreira Rato & Filhos, Germano José de Sales (em Lisboa); Emídio Amatucci, António Almeida da Costa, Joaquim Almeida da Costa, Bernardo Marques da Silva (no Porto); João Machado (em Coimbra). Este estudo teve como base um levantamento de obras assinadas em todo o país e seu registo visual, atribuição de autoria em obras não assinadas, elaboração de percursos biográficos e artísticos, descrição e análise das condições de produção e vestígios ainda existentes das mesmas (quando possível).

Dentro das cantarias de ornato, a abordagem foi muito menos aprofundada do que inicialmente previsto, atendendo à mudança do título da tese, aprovada em 2007.

 

Dentro dos artefactos de cerâmica, o estudo foi dirigido sobretudo:

À produção de estátuas alegóricas e outros remates para fachadas e jardins (vasos, pinhas, urnas, arabescos, platibandas, balaustradas, etc.); à produção de revestimentos para fachada – azulejos e cantarias fingidas. Este estudo inclui levantamento em todo o país, registo visual, atribuição de autoria, análise temática, iconográfica e iconológica, comparação e contextualização com exemplos internacionais.
Aos produtores, nomeadamente às maiores e melhores fábricas de cerâmica portuguesas do período romântico com produção vocacionada para complementar a arquitectura, como por exemplo:

Fábrica de Cerâmica das Devesas, Gaia (Porto)

Fábrica Viúva Lamego, Lisboa

Fábrica Roseira, Lisboa

Fábrica da Calçada do Monte, Lisboa

Fábrica Progresso Artístico (J. J. Almeida Junça), Lisboa

Fábrica de Sacavém, Lisboa

Companhia Cerâmica de Telheiras (J. Lino), Lisboa

Fábrica de José Gregório Baudoin, Lisboa

Fábrica de Santo António do Vale da Piedade, Gaia (Porto)

Fábrica do Monte Cavaco, Gaia (Porto)

Fábrica do Carvalhinho, Porto

Fábrica de Massarelos, Porto

Fábrica de Miragaia, Porto

Fábrica de José Pereira Valente, Devesas, Gaia (Porto)

Empresa Industrial de Ermesinde (Porto)

Fábrica de Jerónimo Pereira Campos (Aveiro)

 

Pampilhosa - sucursal da Fábrica de Cerâmica das Devezas 

 

 

ContactoDe modo a podermos aprofundar a nossa investigação, gostaríamos de ser contactados por quem possa dar informações sobre peças destas antigas fábricas, colocando-nos ao dispor para, em troca, fornecer as informações que formos recolhendo.

 

Também solicitamos intercâmbio de informações sobre os seguintes nomes do século XIX (e início do século XX), todos referentes a fábricas de cerâmica:

- Nomes referentes à Fábrica das Devesas:

Albino Rodrigues Pinto Barbosa (pintor e fotógrafo)

Adelaide Teixeira Lopes Barbosa

Bernardo José Soares Breda e Francisco Correia Breda

Emília de Jesus Costa (sobrinhos)

José Joaquim Teixeira Lopes

Feliciano Rodrigues da Rocha (industrial falecido em 1930, cujos filhos tiveram uma fábrica de cerâmica)

Eduardo Rodrigues Nunes

Aníbal Mariani Pinto

João Quito (ainda vivo em 1914))

Joaquim Gonçalves da Silva (escultor)

 

- Outros nomes:

Ângelo da Silva Macedo (Fábrica do Cavaco)

António Alves Lourenço (depósito de cal e gesso)

António Filipe dos Santos & C.ª (Vilar do Paraíso)

António Macedo & C.ª (Monte do Cavaco)

António Moreira do Vale

António Nunes Dias de Freitas & Filho (Fábrica do Carvalhinho)

António Nunes Dias de Freitas (Fábrica do Carvalhinho)

António Pereira Campos Júnior (estabelecimento de lousa)

António Pereira Cantarino (Fábrica do Carvalhinho)

Barbosa, Branco & C.a (Fábrica do Senhor de Além)

Braga & Irmão (Fábrica do Senhor de Além)

João António Vieira Braga (Fábrica do Senhor de Além)

Cândido Augusto de Castro (Largo da Bandeira, Gaia) ou Augusto Sá Castro ou Cândido Augusto de Sá Castro

Chambers & Wall (Fábrica de Massarelos)

Clementina Vieira da Costa Lima Arnaud, Sucessora (Fábrica de Massarelos), viúva de João da Rocha e Sousa Lima

Companhia das Fábricas Cerâmica Lusitânia

Empresa da "A Constructora" ou Fábrica Progresso

Félix de Araújo (Candal)

Francisco da Rocha Soares (Fábrica de Santo António do Vale da Piedade, Massarelos e Miragaia)

Gaspar Gonçalves de Castro (Bandeira)

Padre Gualter da Piedade Queiroz (Monte da Afurada, Monte Cavaco)

João da Rocha e Lima ou João da Rocha e Sousa Lima (Restauração e Massarelos)

João de Araújo Lima (Fábrica de Santo António do Vale da Piedade)

João do Rio Júnior (Fábrica de louças em Santo António do Vale da Piedade)

João José da Fonseca

João Nogueira (Cavaco)

João Nunes da Cunha (Monte da Afurada)

Joaquim Alves dos Santos (ou Joaquim Ventura)

Joaquim José Pereira (olaria e fábrica de asfalto)

Joaquim Nunes da Cunha (Cavaco)

Joaquim Vitorino Domingues Ventura (fábrica de telha e tijolo, Vilar do Paraíso)

José Fernandes Dias & C.ª (Rua do Príncipe, Porto)

José Joaquim Alves (depósito de cal, gesso e louça)

José Lopes Rios & Irmão (Fábrica de Santo António do Vale da Piedade)

José Luís Alves Viana (deposito de cal, gesso, tubos de grés, tijolos, azulejos, vasos, pinhas e mais pertences a este género)

José Maria Rodrigues de Ascensão (Fábrica do Fojo)

José Monteiro de Lima (Devesas)

Júlio Camilo de Castro Júnior (Fábrica do Carvalhinho)

Luís Nunes da Cunha (Fábrica do Cavaco)

Manuel Alves Ferreira Pinto (Fábrica de Santo António de Vale da Piedade)

Fábrica de Santo António do Vale da Piedade em Gaia - marca Santo António, Porto

Manuel de Oliveira & C.a (agente da Fábrica das Devesas e Pampilhosa, Armazém de materiais para construções)

Manuel José Dias (olaria e fábrica de asfalto)

Manuel José Soares (Torrinha)

Manuel Nunes da Cunha (Mesquita)

Margarida Emília Soares Rego (Fábrica da Torrinha) ou viúva Soares Rego ou Viúva Soares Rego & Sucessores

Pinto de Magalhães (Fábrica de Monchique)

Quaresma, sobrinhos & C.a (fábrica de asfalto, gesso, cal, cimento, louça grossa e diversos encanamentos)

Rodrigues dos Santos (Fábrica do Senhor de Além)

Silva Moreira (fábrica de mosaico)

Soares Guedes & C.a (deposito de cal, gesso, tubos de grés, tijolos, azulejos, vasos, pinhas e mais pertences a este género)

Tomás Nunes da Cunha & Silva (Fábrica do Carvalhinho)

Tomás Nunes da Cunha ou Tomás Nunes da Cunha & C.a (Fábrica de louça e azulejo, no Carvalhinho)

Viúva Gaspar (Fábrica da Bandeira)

 

 

Apresentam-se aqui alguns exemplos de peças que foram e estão a ser estudadas.

Se possuir alguma peça semelhante, envie-nos uma foto e daremos as informações que sabemos sobre a sua eventual autoria, datação, raridade, etc.

Contacto

 

 

Solicitamos também a colaboração e o intercâmbio com outros investigadores, arquitectos, restauradores, antiquários, historiadores, etc. (em Portugal e noutros países), dentro desta área da cerâmica aplicada a edifícios e a jardins no século XIX. 

Aproveitamos para agradecer a todos os que nos têm enviado imagens e dados, em especial aos pesquisadores e coleccionadores brasileiros.

Platibandas balaustres arabescos estátuas alegóricas pinhas globos azulejos vasos - Portuguese and Brazilian architectural ceramics

 

 

Veja-se também:

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© Francisco Queiroz

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Em linha desde (online since): 2004 | Página actualizada em (last modified): 01-05-2012